quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Joan Scott – O enigma da igualdade

Por Messias Brito
                Diante de conceitos que se relacionam conflituosamente entre si nos habituamos a considerá-los em pares como antagônicos e excludentes: igualdade x diferença, indivíduo x grupo. Porém, Joan Scott – historiadora estadunidense que se dedica ao estudo de gênero como uma categoria de análise e um campo de pesquisa - tem nos ensinado que tratar tais conceitos como opostos significa perder o ponto de suas interconexões e deixar escapar a tensão como elemento constituinte da própria inter-relação entre ambos. Ela defende que estes conceitos devem ser tomados em termos de paradoxo e não de oposição.
                Esta reflexão teórica, não obstante crie dificuldades para mentes acostumadas a optar por uma coisa ou outra, apresenta uma leitura mais coerente, por exemplo, da tensão presente entre a identidade coletiva e a identidade individual que paradoxalmente se constrói apoiada na identidade do grupo e contra esta mesma identidade. De modo que, embora os grupos sociais limitem e obscureçam as peculiaridades individuais, possibilita para estes mesmos indivíduos um agrupamento de forças sociais capaz de promover reivindicações de justiça e equidade contra desmandos que atingem a todos os membros. Por outro lado, muito embora a própria denúncia da situação das “minorias” - feitas minorias por processos históricos de diferenciação social - evidencie as discriminações sofridas, o faz exatamente para combater estas mesmas discriminações.
                 A perspicácia da autora está em perceber a dissimulação posta na abstração do conceito de indivíduo que dissimula a particularidade dos traços normativos atribuídos a este indivíduo (homem branco europeu e iluminista). Do mesmo modo, também em outras áreas, raça é considerada uma questão de negritude e não de branquitude; gênero uma questão de mulher e não de homem. Scott conclui seu texto nos convidando a olhar com argúcia como os processos de diferenciação social acontecem e como os discursos para a sua justificação são construídos e difundidos. A afirmação da igualdade entre todos que nega as estratificações e as disparidades de poder presentes na sociedade se constitui em uma falácia que serve à conservação das discriminações e injustiças sociais.

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